quarta-feira, 18 de maio de 2011

Kantigamente! Hoje, é o grande dia! Depois de muitos meses de trabalho, tudo acontecerá em um hora e qualquer coisa. Espero que corra tudo bem, conforme planeado e fique para a posteridade. Está em causa, não só, muitas horas de trabalho, como também o empenho emocional, profissional, artístico de umas dezenas de pessoas.
«Tenho uma proposta para te fazer. Em 2003, a Simone vai comemorar os seus quarenta e cinco anos de carreira. E tenho de produzir um espectáculo, para celebrar o acontecimento. Vai-se chamar  “Kantigamente”! Terei de fazer o alinhamento, escolher as canções, os artistas convidados, marcar reuniões com os possíveis patrocinadores, entidades oficiais, ou não, que possam apoiar também o espectáculo, como a Câmara Municipal de Lisboa, televisões, escolher o teatro, comunicar à imprensa…Sei lá, haverá tanto para fazer! Quero que colabores connosco, com a Casa das Artes, dando ideias, indo a reuniões, ajudando-nos na escolha das canções… E se não te importares faremos de tua casa o quartel-general, deste grande evento. O espectáculo irá realizar-se possivelmente em Fevereiro. Ainda temos aproximadamente quatro meses. Estás de acordo?»
Era difícil recusar. Nunca tinha participado em nada de parecido e seria uma experiência muito gratificante poder ajudar a erguer um espectáculo que fosse um marco na história da canção portuguesa e à altura da nossa melhor interprete, a Senhora D. Simone de Oliveira.
A minha casa enchia-se de gente, principalmente ao fim-de-semana. Inicialmente, e muitas vezes pela madrugada dentro, eu, a Adelaide e o João, ajudávamos a Fátima a elaborar o espectáculo, criar a história.
«Sim, um mímico! Boa ideia, Adelaide! Ele fará a ligação entre as canções, contará a história da cantora, actriz, locutora, escritora, apresentadora, comendadora, mulher, mãe! O André Maia era capaz de o fazer bem! Ele é um excelente actor!»
«Procura por ele; contacta-o! Ele que veja se tem disponibilidade para Fevereiro e venha à reunião no próximo sábado. Também vêm os cantores. No domingo, estarão cá o maestro José Marinho e o coreógrafo produtor Miguel Vilhena e a coreógrafa assistente Paula Fonseca.»
Era importante, sendo conhecida por todos, que a história fosse contada da melhor maneira, para que o grande musical tivesse brilho, êxito. Seleccionar as cantigas, que ao longo de quarenta e cinco anos foram interpretadas por Simone e cantadas também por todos nós, pelo sucesso e o forte simbolismo que algumas assumiram, como a célebre Desfolhada, com letra de Ary dos Santos e música de Nuno Nazareth Fernandes, que em 1969, representou Portugal no Euro Festival da Canção, em Madrid, não era tarefa fácil. Uns gostavam mais de umas, outros de outras. Não havia consenso, mas tinha-se de escolher.
«Toma nota, Fernando. Para a abertura “Cordão Umbilical”. Por anos seleccionei as seguintes: 1962 “Ontem e Hoje”, 1963 “Olhos nos Olhos”, 1965 “Sol de Inverno”, saltamos para 1967 com “Fúria de Viver” e “Renascendo”, 68 “Canção Solidão”, 69 “Desfolhada”. Desfolhada inicialmente não será cantada, só tocada e dançada. Sê-lo-á no fim por Simone mais dois cantores convidados, que ainda não defini, talvez a Lara e o Girão. 1973 “Apenas o meu Povo” e “Intróito”. A Lara cantará esta canção divinamente, tenho a certeza! 1974 “ Tango Ribeirinho” e “Camarada”. Depois 1981 “Poema 8”, 82 Alma minha Gentil, 83 “Apaixonadamente”. Quero depois, referindo as épocas do Passa por mim no Rossio, Maldita Cocaína e da Marlene Dietrich, três bons momentos de music hall. As canções seguintes para a última parte são: “Esta Lisboa que Eu Amo”, “ Visita de Camarim”, “Maria Solidão”, Auto-retrato”, “Antigamente”, “Sangrando” e para grande apoteose final a “Desfolhada”.»
Fátima é inteligente, tem o instinto aguçado e muita experiência, sabe o que, o público gosta e consegue sempre chegar ao fim de qualquer trabalho e ter um grande e unânime aplauso; a crítica é-lhe sempre favorável. É uma líder do palco até o espectáculo começar, depois uma criança encantada, nervosa, a ver a sua obra, os seus artistas, também a sua arte; a arte do espectáculo.
«Fátima, já está definido quem irá cantar as canções escolhidas?»
«Sim! Terás de contactar, Adelaide, com os managers dos Anjos e da Sara Tavares. Eu falarei com a Lara Li, Wanda Stuart, Francisco Ceia e Fernando Girão. Quero também um grupo de Tunas para “Esta Lisboa que Eu Amo”.»
Adelaide uma formiga trabalhadeira! Nunca pára. Sempre cheia de ideias e pronta para livrar qualquer embarcação de se afogar. Há uma história divertidíssima, em que, estando nos bastidores, salva uma cena de teatro, o telefone não tocou e imita-o com um suave, a medo, trim-trim.
Nomes, números de telefone, ligar, combinar, marcar, ir, fazer, escolher… Músicos, bailarinos, cenografia, técnicos de som, luzes, gráfica, catering, salas para ensaio… O São Luiz Teatro Municipal foi o espaço finalmente escolhido para o espectáculo.
Estão todos nervosos. O ensaio geral correu bem! Eu estou cansadíssimo! Esta noite quase não fui à cama! Mas a emoção é grande!
As luzes apagam-se e o pano abre-se.
«...Por mim perdida, por mim achada. Lá, lá, lá...»
«Bravo! Bravo! Bravo!..»

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